Em muitos países desenvolvidos, os dados abertos têm sido utilizados não somente como mecanismo de fiscalização dos governos, mas também como suporte à elaboração de políticas públicas, sendo ainda a base de criação de novas tecnologias. O pesquisador do CEPID- CeMEAI Luis Gustavo Nonato opinou sobre o tema neste artigo que analisa como o Brasil também poderia evoluir na tecnologia. Confira o artigo:
Dados Abertos na América do Sul: quem fará uso?
Autor: Luis Gustavo Nonato
O número de bases de dados com acesso público, os chamados Dados Abertos (Open Data), tem crescido de forma significativa nos países sul-americanos (veja gráfico abaixo). Como nos países desenvolvidos, a geração de dados abertos na América do Sul tem ocorrido de forma descentralizada, com iniciativas ligadas a movimentos sociais, setor produtivo, universidades e governos. Os governos, porém, tem tido papel fundamental neste cenário, não só como agente provedor de dados abertos, mas também como responsável pela organização e disponibilização de tais dados. De fato, a maioria dos países sul americanos possui atualmente portais de dados abertos financiados e gerenciados por seus governos federais:
- Argentina – http://datos.gob.ar/
- Brasil – http://dados.gov.br/
- Chile – http://datos.gob.cl/
- Colômbia – https://www.datos.gov.co/
- Peru – http://www.datosabiertos.gob.pe/
Nos países desenvolvidos, dados abertos tem sido utilizados não somente como mecanismo de fiscalização dos governos, mas também como suporte à elaboração de políticas públicas, sendo ainda a base de criação de novas tecnologias. Iniciativas como BlindSquare, que auxilia a locomoção de deficientes visuais, Ottawa Recycle, que orienta cidadãos sobre quando e onde depositar lixo reciclável, e Spot Crime, que mapeia a criminalidade em cada região da cidade, são bons exemplos de como dados públicos podem melhorar a qualidade de vida das pessoas, influenciar na mudança de comportamento e impulsionar a criação de empresas, emprego e renda.
Porém, para que dados abertos impactem positivamente na sociedade e na economia de um país, faz-se necessário mão de obra extremamente qualificada, a qual é escassa na América do Sul. O que agrava ainda mais o cenário é a lentidão com que os países sul-americanos têm reagido à falta de profissionais capazes de gerar conhecimento e produtos a partir de dados abertos. Enquanto países desenvolvidos investem fortemente na formação de mão de obra qualificada (veja tabela abaixo), países sul-americanos estão quase inertes a revolução tecnológica impulsionada pelo acesso à grandes conjuntos de dados. Uma pesquisa no cadastro de cursos de graduação dos países sul-americanos revela a inexistência de cursos na área de ciência de dados (data science). Em outras palavras, atualmente não existe sequer um curso de graduação em ciência de dados em toda América do Sul.
Número de Cursos de Graduação em Ciência de Dados nos Países Desenvolvidos (nenhum curso de graduação em ciência da dados na América Latina)
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Número de Cursos |
Diante do cenário atual, países sul-americanos estão fadados a continuarem como consumidores de tecnologias produzidas por países desenvolvidos, muitas das quais projetadas para atender demandas daqueles países. O acesso aos dados abertos da América do Sul pelas empresas do primeiro mundo, permitirá que tais tecnologias sejam adaptadas ao contexto sul-americano, encorajando cada vez mais o consumo de soluções prontas produzidas nos países desenvolvidos. Tal dependência exclui os países da América do Sul do grupo que protagoniza a geração de conhecimento e tecnologia a partir de dados, reduzindo a competitividade dos países sul-americanos no novo mercado que se abre.
Desta forma, é incontestável a urgência na capacitação de mão de obra capaz de explorar o universo de oportunidades geradas pelo acesso à dados públicos. Cidadãos, universidades e governos sul-americanos precisam se mobilizar rapidamente no sentido de construir uma rede de colaboração em ciência de dados, promovendo a criação de novos cursos de graduação e pós-graduação, fomentando projetos de pesquisa conjuntos e viabilizando a mobilidade de estudantes e pesquisadores entre os países da América do Sul, buscando assim acelerar a formação de mão de obra qualificada. Somente uma reação rápida e conjunta, voltada para capacitação de parcela significativa da população, dará chance aos países sul-americanos de competir neste novo “mercado de dados” que se apresenta.